sábado, 26 de junho de 2010

minha grata surpresa


Pela amizade que você me devota,
por meus defeitos que você nem nota...
Por meus valores que você aumenta,
por minha fé que você alimenta...
Por esta paz que nós nos transmitimos,
por este pão de amor que repartimos...
Pelo silêncio que diz quase tudo,
por este olhar que me reprova mudo...
Pela pureza dos seus sentimentos,
pela presença em todos os momentos...
Por ser presente, mesmo quando ausente,
por ser feliz quando me vê contente...
Por este olhar que diz "Amigo, vá em frente!"
Por ficar triste, quando estou tristonho,
por rir comigo quando estou risonho...
Por repreender-me, quando estou errado,
por meu segredo, sempre bem guardado...
Por seu segredo, que só eu conheço,
e por achar que apenas eu mereço...
Por tudo isso e muito mais eu digo:
Te amo miga


Kelly Maia

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Temo - TeAmo



Ser amado e amar significa “entrega em intimidade”, isto é, sintonia das emoções. Quando entregamos uma parte do nosso espaço e tempo à pessoa amada, não significa que perdemos nossa individualidade.

Entregar-se significa deixar de viver analisando, apegando-se a velhos preconceitos. É dar um salto no abismo, é acolher o novo de mente aberta.

Muitas pessoas não ousam sequer deixar o lar dos pais para estudar fora, com medo do novo, do imprevisível. Quando vão a uma festa, querem saber de antemão tudo o que vai acontecer. Quando estão com alguém, querem que as coisas aconteçam à sua maneira. Com isso, restringem-se a uma vida repetitiva.

Numa noite escura, um homem andava no meio de uma floresta. De repente, ele caiu. A única coisa que conseguiu fazer foi segurar-se em um galho. Quando olhou para baixo, só viu escuridão. Começaram então os pensamentos catastróficos: “Eu vou cair neste abismo e vou morrer... Este galho não vai agüentar, eu vou me machucar todo”. À medida que o tempo passava, o galho ia se desprendendo, e cada vez mais o homem se desesperava, com medo de cair e morrer. A claridade foi chegando com a manhã, e então ele percebeu que estava com os pés a apenas quarenta centímetros do chão e que todo o seu medo e sofrimento tinham sido infundados.

Assim fazem as pessoas que não se soltam das raízes do passado para voar em direção aos sonhos do presente. Ficam com medo de se arrebentar, quando, na realidade, o salto a ser dado tem pouco mais de quarenta centímetros: a distância que separa o cérebro do coração.

Este é o grande salto a ser dado: parar de viver o tempo todo se analisando e deixar de ouvir o “juiz” que existe na sua cabeça. Passar a viver os acontecimentos, em vez de ficar julgando a si mesmo, o outro e tudo o que está ocorrendo.

Muitas pessoas confundem entrega com submissão, o que é um erro, pois cada uma delas se origina em um ponto distinto da personalidade. Enquanto a entrega tem origem na autovalorização e é movida pelo amor, a submissão decorre de um sentimento de inferioridade e é mobilizada pelo medo.

Ser amado e amar significa “entrega em intimidade”, isto é, sintonia das emoções. Quando entregamos uma parte do nosso espaço e tempo à pessoa amada, não significa que perdemos nossa individualidade.

Na entrega, tornamo-nos transparentes para o outro, despidos de qualquer máscara, o que possibilita ao ser amado nos ver e nos sentir exatamente como somos.

Na entrega, é como se um pudesse ver o que o outro está pensando, porque estão sintonizados na mesma freqüência de sentimentos.

A confiança é o suporte básico para a entrega e necessita ser mútua, isto é, não pode ser unilateral num grande amor. Todos temos guardados, dentro de nós, nossos segredos, nossos sentimentos, nossas dúvidas, inquietações e medos; nossa genialidade, nossa criatividade, nossa beleza, sensualidade e sexualidade; todas as nossas verdades, vivências e experiências boas e ruins, que representam o nosso tesouro íntimo e que só nós conhecemos e fazemos questão de manter no fundo do nosso ser.

Entregar-se ao outro é presenteá-lo com a chave desse cofre, é transformá-lo num explorador e co-guardião dessas riquezas. E, na entrega mútua, os tesouros se fundem e se transformam num grande amor — cada um é depositário e depositante da riqueza dos dois. Nessa fusão, o par de amantes transcende e se integra no Universo.

Para muitos, isso pode parecer uma grande ameaça, porque a entrega implica comprometimento com o amor. Não se entregando profundamente a alguém, fica a pessoa se entregando aos pedacinhos a várias, o que representa desgaste, tensão e uma dicotomia muito grande. É feita uma oferta de chaves falsas, que jamais abrirão cofre nenhum.

Conseqüentemente, também são recebidas chaves falsas.
Muitas vezes nem nós mesmos conhecemos o nosso tesouro; esquecemos o seu segredo. Pode ser que só possamos ter acesso a ele através do amor e da entrega, porque a pessoa amada vai nos ajudar a ter coragem de mergulhar nas profundezas, sem medo do que possamos encontrar, e até mesmo nos tornar curiosos por descobrir mais.

Analisando o que temos feito na vida, vemos que, muitas vezes, nos preparamos para o banho, chegamos perto do mar, mas acreditando que a água está fria desistimos de nadar e voltamos para casa frustrados. Tendo consciência disso, podemos aprender a mergulhar nas águas do amor, ainda que elas signifiquem um banho frio.

O importante é a percepção de que frustrações desnecessárias geram um sentimento de incapacidade e que a entrega significa lançar-se neste mar — com a força dos braços e das pernas, saberemos fazer nosso corpo esquentar-se e fortalecer-se no amor.

Roberto Shinyashiki
Tela - Van Gogh

O caminho só existe quando você passa...



Assim ela já vai
Achar o cara que lhe queira
Como você não quis fazer
Sim, eu sei que ela só vai
Achar alguém pra vida inteira
Como você não quis...

Tão fácil perceber
Que a sorte escolheu você
E você cego, nem nota
Quando tudo ainda é nada
Quando o dia é madrugada
Você gastou sua cota...

Eu não posso te ajudar
Esse caminho não há outro
Que por você faça
Eu queria insistir
Mas o caminho só existe
Quando você passa...

Quando muito ainda é pouco
Você quer infantil e louco
Um sol acima do sol
Mas quando sempre
É sempre nunca
Quando ao lado ainda
É muito mais longe
Que qualquer lugar...

Um dia ela já vai
Achar o cara que lhe queira
Como você não quis fazer
Sim, eu sei que ela só vai
Achar alguém prá vida inteira
Como você não quis...

Se a sorte lhe sorriu
Porque não sorrir de volta
Você nunca olha a sua volta
Não quero estar sendo mau
Moralista ou banal
Aqui está o que me afligia...

Um dia ela já vai
Achar o cara que lhe queira
Como você não quis fazer
Sim, eu sei que ela só vai
Achar alguém pra vida inteira
Como você não quis...

Música: Skank - Acima do Sol

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Ser Psicólogo



O psicólogo não adoece, somatiza;
O psicólogo não transa, libera libido;
O psicólogo não estuda, sublima;
O psicólogo não dá vexame, surta;
O psicólogo não esquece, abstrai;
O psicólogo não fofoca, transfere;
O psicólogo não tem idéia, tem insight;
O psicólogo não resolve problemas, fecha gestalt;
O psicólogo não muda de interesse, altera figura-fundo;
O psicólogo não se engana, tem ato falho;
O psicólogo não fala, verbaliza;
O psicólogo não conversa, pontua;
O psicólogo não responde, devolve a pergunta;
O psicólogo não desabafa, tem catarse;
O psicólogo não é indiscreto, é espontâneo;
O psicólogo não dá palpite, oferece alternativa;
O psicólogo não fica triste, sofre angústia;
O psicólogo não acha, intui;
O psicólogo não faz frescura, regride;
O psicólogo não mente, resignifica;
O psicólogo não paquera, estabelece vínculo;
O psicólogo não é gente, é estado de espírito...

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Não digital e 7 formas de levar um fora



Ontem li um texto sobre a questão de bloquear pessoas nas redes sociais, recentemente tive uma discussão sobre o "Não Digital"... Venho pensando sobre todas estas questões e sobre o tempo que investimos nestas ferramentas de comunicação que talvez não mais comuniquem apenas exponham a sociedade onde o narcisismo impera absoluto e passa desapercebido, a globalização já é secundária, o que importa mesmo é a hora do show. E ai meu amigo, é nestas horas que todos querem seu minuto de fama... Ninguém fica impune - inclusive eu. Mas essa na verdade é outra discussão...
Tenho tentando lidar da melhor forma possível com os insistentes de plantão, aqueles que conheço mas não tenho interesse de incluir em minha rede pois nela guardo muitas informações extremamente pessoais, besteiras, muitas besteiras (das quais não quero ser julgada por elas), e fotos, muitas fotos como bebendo na praia por exemplo. Mantenho uma linha de corte do que é profissional e pessoal, para contatos profissionais uso o Linkedin e o Twitter... e nestes eu aceito todo mundo porque quero muito expandir minha rede....
Voltando a falar dos insistentes, tem gente que eu aceito por educação (boa vizinhança) e dias depois excluo, seja porque é uma pessoa muito distante do meu mundo ou porque eu conheço apenas do trabalho. Existe também aqueles que por mérito foram excluídos da minha vida e pra minha surpresa (mesmo bloqueados) aparecem eventualmente com um novo convite ou nas atualizações das visitas do perfil...
O fato é que quando eliminamos alguém da nossa rede essa pessoa não deixa de existir... Quando rompemos relacionamento com alguém ou quando alguém do nosso convívio não nos "interessa" mais, temos o "direto" de bloquear ou até mesmo excluí-la, como bem colocado pelo minha adorável Psicótica Natalia Klein: "Quando você bloqueia alguém no Facebook, essa pessoa não deixará de existir. Não vai abandonar seus pensamentos nem vai desaparecer das suas lembranças (tais como aquele dia em que você falou para ele não bagunçar seu cabelo, mas ele bagunçou mesmo assim e depois disse que era impossível não se apaixonar por você). Todo laço que antes você mantinha com aquela pessoa, seus sentimentos, suas expectativas, tudo será perdido. Note que tal bloqueio não pode impedir todas as comunicações e interações na vida. O Facebook não se responsabiliza caso você encontre essa pessoa no supermercado ou na livraria. Nem muito menos se ela estiver acompanhada de outra pessoa. Mais ou menos bonita que você".
E ai que eu me refiro, talvez pior que do tentar violentamente, abruptamente excluir essa pessoa da sua existência pior ainda é quando você é negligenciado(a) por seis tecnologias diferentes..Orkut, MSN, Facebook, E-mail, celular, telefone pessoal e comercial (ambos com caixa postal) e ao vivo... pior... mas muito pior é quando você tenta desesperadamente chamar a atenção de alguém colocando frases diárias de profunda reflexão, sacanagem, motivação, fúria e outras e a pessoa não se indigna a dar um comentariozinho que seja... ai você tem de conviver com a dura realidade da indiferença, e ainda tem que conviver com as atualizações do vivente se divertindo horrores, e você de fora, pior ainda é quando você espera arduamente pela aquela janelinha do MSN com um "oi" só um oi já seria o suficiente, INFELIZ, pelo menos pra começar, e ele(a) não vem... pior ainda quando você atualiza os e-mails toda hora e verifica o sinal do telefone a cada 10 minutos e toda vez que o maldito toca é alguém da sua operadora querendo lhe oferecer um upgrade de plano... tudo isso é bem ruim mesmo... mas tenho que admitir pior mesmo é ao vivo... aquela frase que começa lenta mas toma a velocidade de uma bala que vem reto em direção ao coração - acho que não estou preparado(a) para uma relação séria "agora"... acho que o agora é que termina matando lentamente... e ai você parte pra outra e começa tudo de novo... adiciona aqui, atualiza ali... E assim a gente vai...

Bela

terça-feira, 15 de junho de 2010

A psicanálise é a cura dos otários?



Sou psicanalista há mais de vinte anos, mas até hoje me espanta que as pessoas ainda procurem a psicanálise para tentar resolver seus conflitos, sair do sofrimento repetitivo, decifrar seus sintomas. Não que eu duvide da eficácia da psicanálise - pelo contrário.
O que me espanta é que tanta gente ainda escolha o percurso lento e sofrido de uma psicanálise nesses tempos de terapias breves, guias de auto-ajuda, medicações milagrosas.
A psicanálise é o avesso da pressa. Sua eficácia difere radicalmente da eficiência pragmática tão cara à nossa cultura neoliberal.
O psicanalista não aconselha, não promove o ego de ninguém, não alivia quase nada. Numa outra vertente ideológica, o psicanalista diverge também do guru complacente, a conduzir seus adeptos pelos caminhos da morada interior, onde supostamente viveria o 'verdadeiro eu' - essa ficção tão cara à modernidade. Por isso ela me parece desajustada à vida contemporânea, na qual se acredita que um 'ego' bem cultivado seja condição do sucesso e da inclusão social.
Afinal, a psicanálise também é o avesso do universo de imagens fulgurantes em que vivemos hoje, e com as quais tentamos nos identificar; ela é o império do significante, da palavra com seu fundo falso, sua parcela de vazio e de no sense. Por fim, o objeto da psicanálise é o desejo inconsciente, não o 'ego'.

Não é confortável habitar o terreno do desejo inconsciente. Não é parecido com o palacete narcísico da 'morada interior' abrigo do (suposto) eu verdadeiro que alimenta as aspirações individualistas. No terreno escorregadio do desejo, o sujeito é um eterno sem-teto: vive acampado, nômade, mudando sua tenda de cá para lá de acordo com os ventos e as chuvas. É que o desejo inconsciente não é uma 'coisa' de que o analisando possa se apoderar e controlar, como um habitante incômodo da casa ao qual se reserva um quartinho nos fundos para que ele não perturbe o andamento geral das coisas. Nem é o que se chama hoje, vulgarmente, de desejo (sexual), ou seja: as fantasias (explícitas) de consumo e sexo que apelam para nós de fora para dentro, nos objetos e mensagens da indústria cultural. O efeito de uma psicanálise não é o controle racional do inconsciente, nem a 'realização' do desejo; não é liberar o sujeito da incômoda presença do desejo inconsciente, e sim propiciar que ele suporte desejar.
Neste sentido, a psicanálise me parece um tanto anacrônica.

No aparente império do desejo em que vivemos, onde cada um se acredita no direito ('você merece'!, dizem as mensagens publicitárias) de realizar imediatamente todas as fantasias, a maior parte das pessoas parece ter vergonha de desejar.
Por isso escrevi que o império do desejo é aparente: vivemos mesmo é no império do gozo - 'tudo ao mesmo tempo agora' em que o desejo, que se realiza no trabalho de simbolização e não na posse das coisas, não tem muito lugar. Repito o que escutei em uma conferência do filósofo esloveno Slavoj Zizek: uma das tarefas fundamentais do psicanalista, hoje, é autorizar o analisando a não gozar - e se manter desejante. Nesse sentido, o dispositivo analítico - que mudou muito pouco em um século de existência - deve operar em uma direção oposta à dos tempos de Freud. Hoje já não se trata tanto de permitir a expressão das fantasias inconscientes
recalcadas (cujo conteúdo era impensável para a moral vitoriana), e sim de levar o analisando a se perdoar por não conseguir realizar a profusão de fantasias que circulam nas mensagens e apelos da indústria cultural. Não se trata de proibí-lo de gozar e sim de autorizá-lo a não gozar. Pois o imperativo do gozo é tão severo e tão exigente quanto a proibição a toda forma de gozo. O super-eu, instância crítica e sádica que atormenta o eu com suas normas rígidas e suas ameaças de castigo, tanto obriga a gozar quanto proíbe o gozo. Do ponto de vista do supereu, o imperativo: 'goza!' é tão severo quanto a proibição: 'não goza!'. Autorizar o sujeito a não gozar é muito diferente de proibir o gozo: é trabalhar para que ele possa se libertar da relação e servidão com o superego.

Na contracorrente do senso comum, muita gente continua procurando os consultórios dos psicanalistas atrás de um tipo de tratamento que, se não é o mais eficiente, a meu ver é o mais ético, já que ao sair de uma análise o sujeito deve ser capaz de se responsabilizar pela sua condição desejante. O que me espanta é que a sedução dos dispositivos de adaptação das pessoas à cultura do narcisismo e do consumo ainda encontre resistências entre os que procuram os consultórios dos psicanalistas. Não: a palavra 'resistência' lembra sacrifícios, barreiras morais, ascese, recusa do prazer. As pessoas não procuram a psicanálise para 'resistir' aos prazeres oferecidos pela sociedade do espetáculo e do consumo. Procuram análise porque não conseguem se adequar a eles. É claro que cada candidato a uma análise tem suas queixas e seus sintomas particulares.
Mas escuto com muita freqüência queixas do tipo: 'eu não consigo me divertir tanto quanto eu deveria'. As pessoas, maduras ou jovens (acho que os jovens sofrem mais) vivem em dívida com o gozo. Alguém disse, uma vez: 'é como se em algum lugar estivesse acontecendo uma festa espetacular, onde todos estivessem se divertindo além de todos os limites , só que eu não tenho o endereço'. O neurótico, hoje, não se sente um pecador, um impuro, como no início do século XX: sente-se otário. Barrado no baile.
A psicanálise é a cura dos otários? Talvez sim: só que o psicanalista não oferece o endereço da tal festa a ninguém. Ele nem sabe o endereço. No máximo, o analista sabe que o cara que se imagina otário não está perdendo festa nenhuma; a festa do gozo permanente não é proibida, nem é restrita aos mais espertos. Ela é simplesmente impossível de se realizar. Mas isso, o analisando vai descobrir por ele mesmo - se quiser deixar de ser otário.

Obra - Girl reading a book on the beach - Pablo Picasso
Texto - Maria Rita Kehl

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Procura-se beijos que satisfaçam!


A impressão que tenho é de que estamos todos tentando satisfazer um mesmo desejo, porém de maneira tão individualista e ansiosa que perdemos a noção do que realmente importa.

Assim, a carência afetiva tem se transformado numa verdadeira epidemia. Vivemos num mundo onde tudo o que fazemos nos induz a “ter” cada vez mais. Um celular novo, um sapato de outra cor, uma jaqueta diferente, uma viagem em suaves prestações...

E enquanto isso, nos sentimos cada vez mais vazios. Nossa voz interna faz um eco que chega a doer; e tudo o que poderia nos fazer sentir melhores seria “apenas” um pouco de carinho.

A carência é tão grande, a sensação de solidão é tão forte que nos dispomos a pagar por companhia, por uma remota possibilidade de conseguir um pouco de carinho. Talvez você argumente: “de forma alguma, eu nunca saí com uma garota ou um garoto de programa; jamais pagaria para ter carinho!”.

Pois é, mas não é de dinheiro que estou falando. Estou falando das escolhas que fazemos, indiscriminadamente, em busca de afeto; das relações sexuais fáceis e fugazes, da liberação desenfreada de intimidade, da cama que chega às relações muito antes de uma apresentação de corações... Expomos nossos corpos, mas escondemos nossos sentimentos de qualquer maneira!!!

Ou, ao contrário de tudo isso, estou falando da amargura e do mau-humor que toma conta daqueles que não fazem nada disso, que se fecham feito ostras, criticando e maldizendo quem se entrega, quem transa, quem sai em busca de afeto...

Enfim, os extremos demonstram exatamente o quanto pagamos. De uma forma ou de outra, estamos pagando pelo carinho que não damos e pelo carinho que, muitas vezes, não nos abrimos para receber.

Ou seja, se sexo realmente fosse tão bom, poderoso e suficiente quanto “prometem” as revistas femininas, as cenas equivocadamente exageradas das novelas ou os sites eróticos, estaríamos satisfeitos, não é? Mas não estamos, definitivamente não estamos!

Sabe por quê? Porque falta conteúdo nestas atitudes, nestes encontros. Não se trata de julgamento de valor nem de pudor hipócrita. Não se trata de contar quantas vezes já esteve com alguém para saber se já pode transar sem ser chamada de ‘fácil’...

Trata-se de disponibilidade para dar e receber afeto de verdade, sem contabilizar, sem morrer de medo de parecer tolo; sem ser, de fato, pegajoso ou insensível... apenas encontrar a sua medida, o seu verdadeiro desejo de compartilhar o seu melhor!

Muito mais do que orgasmos múltiplos, precisamos urgentemente de um abraço que encosta coração com coração, de um simples deslizar de mãos em nosso rosto, de um encontro de corpos que desejam, sobretudo, fazer o outro se sentir querido, vivo. Tocar o outro é acordar as suas células, é revivescer seus poros, é oferecer um alento, uma esperança, um pouco de humanidade, tão escassa em nossas relações.

Talvez você pense: mas eu não tenho ninguém que esteja disposto a fazer isso comigo, a me dar este presente. Pois é. Esta é a matemática mais enganosa e catastrófica sob a qual temos vivido. Quem disse que você precisa ficar à espera de alguém que faça isso por você?!?

Não! Você não precisa, acredite! De pessoas à espera de soluções o mundo está farto! Precisamos daqueles que estão dispostos a “serem” a solução! Portanto, se você quer vivenciar o amor, torne-se o próprio amor, o próprio carinho, a própria carícia. Torne-se a diferença na vida daqueles com quem você se relaciona, para quem você se disponibiliza.

A partir de hoje, ao invés de sair por aí dizendo que vai “beijar muuuuito”, concentre-se na sua capacidade de dar afeto e surpreenda-se com o resultado. Beije sim, sem se preocupar se é muito ou pouco. Beijar é bom, muito bom, sem dúvida; mas empenhe-se antes em trocar afeto, em se relacionar exercitando o respeito pelo outro, o respeito por si mesmo... e estou certa de que os encontros valerão muito mais a pena!

Texto - Rosane Braga - www.rosanebraga.com.br
Tela - Avignon por Pablo Picasso

terça-feira, 1 de junho de 2010

"Diculpa eu cai"



Como todos, eu também tenho aquelas "frases" rotineiras, pensamentos repetitivos, sentimento angustiantes ou eufóricos às vezes sem ligação com uma idéia alguma, mas que martelam até que nos que impulsionam pra frente ou nos empurram pra baixo. Você sabe do que eu estou falando...

Eu sempre tento fazer tudo certo e tudo perfeito como boa neurótica que sou, até que me dei conta (é um processo - ainda em andamento) que o que falta na maior parte do tempo é leveza e espontaneidade, o que falta é me permitir pegar mais leve comigo mesma.

Ouvi recentemente uma história muito bonitinha que de tempos em tempos vem na minha cabeça.

Há umas semanas atrás um amigo estava indo ao supermercado comprar um vinho - obviamente ele estava a caminho da minha casa quando ao entrar no corredor de bebidas viu uma menina cair. A menina devia ter uns três anos acredito.

Em seguida veio àquela voz - a mãe - "Fulana" tenha mais cuidado agora terei de lavar suas mãos novamente... foi então que a criança disse - "Diculpa eu cai".

Essa frase se aplica em várias situações da minha vida. Deste dia em diante sempre que faço algo "errado" ou "sem querer" eu digo - "Diculpa eu cai". Todos que me conhecem e fazem parte do meu convívio entendem, dão muitas risadas com as minhas insanidades, mas a melhor parte é que eu descobri quão libertadora é essa ação de se dar um desconto...

IS

Dia da ofensa


Brigamos quando não desejamos brigar. Existe paz e amor. Não existe paz no amor. John Lennon errou a equação.

Por isso, decidi que agora vou planejar uma briga com a namorada. Agendar uma briga. Arrumar uma data mensal para o inferno dos berros, choro e insultos. É o dia da ofensa no lugar das pequenas e irritantes DRs.

Em vez de avisar que pretendemos nos acalmar e ajudar, que somente pretendíamos conversar na boa, assumiremos que é uma guerra desde a primeira palavra. Dará no mesmo ao querer e não querer discutir.

Não será fácil, vamos rir dispersivos no início, haverá a inclinação para comentar algo do trabalho ou cafungar o pescoço, sentiremos fome, dependeremos de concentração e orelhas fervendo. Mas vale o sacrifício, trata-se de uma catarse necessária para empobrecer os recalques.

Prefiro uma mulher que me ofenda tudo num dia do que uma mulher que me ofenda um pouco por dia. É melhor. Mais sadio. Menos insano.

Desde que os casais aceitem uma regra básica: não vale colher insultos durante o entrevero para cobrar depois.

Pode falar as maiores perversidades e mentiras nos 90 minutos do confronto, incluindo intervalo e troca de lado na cama (gritaria que não dura um jogo de futebol indica o fim do amor). Pode juntar suspeitas avulsas, perguntas ancestrais e rumores antigos. É uma promoção: só nome feio e ofensa de baixo calão. Até xingar a mãe é permitido.

A única exigência é respeitar o território da hostilidade, fazer um círculo de giz no espaço e no tempo e permanecer naquela roda. Nada sai do contexto. Não vale embrulhar salgados e impropérios para a manhã seguinte. Deve-se comer somente na festa da raiva. No instante da cólera. Com sangue quente.

O grande problema dos atritos domésticos é que o insulto de uma briga passa a ser transportado para a seguinte e para a seguinte. No fim das contas, a batalha é uma só que nunca terminou. Uma gripe mal-curada que gera a vontade de cuspir na próxima gripe.

Caso reunirmos uma noite para limpar o pulmão, cansaríamos de tossir e bufar. E o suspiro reencontraria a brisa e pediria para andar de mãos dadas com o beijo.

Feito esse passo, agora é o momento de lavar a honra do ciúme.

Pior do que ciúme é a falta de ciúme. A indiferença é uma doença muito mais grave. Alguém que não está aí para o que faz ou não faz, para onde vai e quando volta. De solidão, chega a do ventre que durou nove meses.

Tão cansativa essa mania de ser impessoal no relacionamento, de ser controlado, de procurar terapia para conter a loucura. Loucura é não poder exercer a loucura.

Permita que sua companhia seja temperamental, intensa, passional. As consequências são generosas. Ela suplicará o esquecimento com mimos, sexo e delicadeza. O perdão é sempre mais veemente do que o rancor.

Repare que no início do namoro todos são descolados, independentes, autônomos. Aceitam ménage à trois, swing e Chatroulette. Não caia, é disfarce, medo puro de desagradar.

Se minha namorada arde de desconfiança, agradeço. Surgirá a certeza de que se importa comigo.

A vontade é abraçá-la com orgulho e reconhecimento, como um aniversário secreto. Às vezes ela cumpre seu ciúme, às vezes ela satisfaz um capricho e atende minha expectativa de ciúme. O importante é que não falha.

Com uma mulher ciumenta ao lado nunca estaremos isolados, nunca estaremos tristes, nunca estaremos feios. Deixo que ela mexa em meu Orkut, deixo que ela leia meus e-mails e chamadas no celular, deixo que ela cheire as minhas camisas, deixo que ela veja meus canhotos e confira os cartões de crédito (com sua revisão, nem dependo de contador, é improvável um engano nas faturas).

Facilitarei o acesso às máquinas, devidamente abertas e ligadas em cima da mesa, e tomarei banho para não incomodar. No jantar, esclarecerei qualquer dúvida.

Perigoso é não responder e deixar a namorada imaginar. Entre a realidade e sua fantasia, mil vezes contar o desnecessário. Estarei em lucro. Não faço nem metade do que ela pressentiu.

Fabricio Carpinejar - http://carpinejar.blogspot.com/

Publicado no jornal Zero Hora
Caderno Donna, domingo (30/05/10), p.19
Porto Alegre (RS), N° 16351